quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Mia Couto


(...)
Tu me bebes

e eu me converto na tua sede.

Meus lábios mordem,

meus dentes beijam,

minha pele te veste

e ficas ainda mais despida.

Pudesse eu ser tu

e em tua saudade ser a minha própria espera.

Mas eu deito-me no teu leito

quando apenas queria dormir em ti.

E sonho-te

quando ansiava ser um sonho teu.

E levito, vôo de semente,

para em mim mesmo te plantar

menos que flor:

simples perfume,

lembrança de pétala

sem chão onde tombar.

Teus olhos inundando os meus

e a minha vida, já sem leito,

vai galgando margens

até tudo ser mar.

Esse mar que só há depois do mar.

Mia Couto

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