domingo, 6 de julho de 2008

Serenata


E todas as vezes que brigavam, ele convocava seus amigos para
que na janela dela pudesse dos seus erros se redimir.
Na viola o acompanhava o moço de dedos longos.
Na voz, já que a sua era a mais feia que qualquer ouvido já ouviu,
estava King Kong, que pelo apelido já se imagina a qualidade de voz.
E mesmo diante a reclamações dos vizinhos, cães latindo,
crianças chorando, com seu caderno com letras de seresta seguia ele:

"Elvira escuta

os meus gemidos

aos seus ouvidos

irão chegar."

Xingam lá nos apartamentos , mas ele segue cantando:

"Não sejas traidora

tem dó de mim

tem dó dest'alma

que te sabe amar."

A mulher de temperamento forte joga um líquido morno lá do alto.

"É licor espanhol", disse o apaixonado homem.
=
"Ela sabe que adoro licor espanhol."

"Tenho minhas dúvidas." disse o violeiro.

Ele enfiou o dedo molhado na boca e provou:

"É licor espanhol."

"Eu não diria que é licor."

"Então o que é?"

"Licor eu sei que não é."

"Venha tirar a teima, King Kong.
=
Prova este precioso líquido e diz se é licor."

"Licor não é não, doutor."

"É o que estou suspeitando, King Kong?"

King kong faz um movimento de cabeça confirmando.

Lambendo os dedos o homem apaixonado diz:

"Urina de amada, licor é."
=
Texto adaptado do livro
Os Mortos não Dançam Valsa de Roberto Drummond


1 comentário:

Anónimo disse...

E se não for da amada? (sorrindo)

Muito bom o texto.