quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Real e belo


Naquele dia, no meio do jantar, eu contei que tentara pegar na bunda do vento.
Mas o rabo do vento escorrega muito e eu não consegui pegar.
Eu teria sete anos. A mãe fez um sorriso carinhoso para mim e não disse nada.
Meus irmão deram gaitadas me gozando.
O pai ficou preocupado e disse que eu tivera um vareio de imaginação.
Mas que esses vareios acabariam com os estudos. E me mandou estudar em livros
Eu vim. E logo li alguns tomos havidos na biblioteca do Colégio
E dei de estudar pra frente. Aprendi a teoria das idéias e da razão.
Especulei filósofos e até cheguei aos eruditos. Aos homens de grande saber.
Achei que os eruditos nas suas altas abstrações se esqueciam das coisas simples da terra.
Foi aí que encontrei Einstein (ele mesmo, o Albert Einstein). Que me ensinou esta frase:
"A imaginação é mais importante do que o saber!"
Fiquei alcandorado! E fiz uma brincadeira.
Botei um pouco de inocência na erudição. Deu certo.
Meu olho começou a ver de novo as pobres coisas do chão mijado de orvalho.
E vi borboletas. E meditei sobre as borboletas.
Vi que elas dominam o mais leve sem precisar de ter motor nenhum no corpo (essa engenharia de Deus!)
E vi que elas podem pousar nas flores e nas pedras sem magoar as próprias asas.
E vi que o homem não tem soberania. Não, não tem !
E percebi que com imaginação meu mundo é muito mais real e mais próximo do que realmente é, ou deveria ser. Belo!

Manoel de Barros

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