segunda-feira, 28 de março de 2011

O açúcar

O branco açúcar que adoçará meu café

Nesta manhã de Ipanema

Não foi produzido por mim

Nem surgiu dentro do açucareiro por milagre

Vejo-o puro

E afável ao paladar

Como beijo de moça,

Água na pele, flor

Que se dissolve na boca


Mas este açúcar

Não foi feito por mim

Este açúcar veio

Da mercearia da esquina e

Tampouco o fez o Oliveira Dono da mercearia

Este açúcar veio

De uma usina de açúcar em Pernambuco

Ou no Estado do Rio

E tampouco o fez o dono da usina

Este açúcar era cana

E veio dos canaviais extensos

Que não nascem por acaso

No regaço do vale

Em lugares distantes

Onde não há hospital

Nem escola, homens que não sabem ler

E morrem de fome aos 27 anos

Plantaram e colheram a cana

Que viraria açúcar

Em usinas escuras, homens de vida amarga

E dura


Produziram este açúcar

Branco e puro

Com que adoço meu café nesta manhã

Em Ipanema



Ferreira Gullar

2 comentários:

Nilson Barcelli disse...

Excelente.
Nunca tinha lido nada do autor.
Boa semana.
Beijos.

Cristina disse...

Oi linda, anda meio sumida, senti falta de suas postagens.
Boa semana
Bjsss