domingo, 30 de julho de 2006

Mário Quintana por Mário Quintana


Nasci em Alegrete, em 30 de julho de 1906. Creio que foi a principal coisa que me aconteceu.
E agora pedem-me que fale sobre mim mesmo.
Bem! Eu sempre achei que toda confissão não transfigurada pela arte é indecente.
Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão.
Ah! mas o que querem são detalhes, cruezas, fofocas... Aí vai!
Estou com 78 anos, mas sem idade. Idades só há duas: ou se está vivo ou morto.
Neste último caso é idade demais, pois foi-nos prometida a Eternidade.
Nasci no rigor do inverno, temperatura: 1grau; e ainda por cima prematuramente, o que me deixava meio complexado, pois achava que não estava pronto.
Até que um dia descobri que alguém tão completo como Winston Churchill nascera prematuro
- o mesmo tendo acontecido a sir Isaac Newton! Excusez du peu...
Prefiro citar a opinião dos outros sobre mim.
Dizem que sou modesto.
Pelo contrário, sou tão orgulhoso que acho que nunca escrevi algo à minha altura.
Porque poesia é insatisfação, um anseio de auto-superação.
Um poeta satisfeito não satisfaz.
Dizem que sou tímido.
Nada disso! sou é caladão, introspectivo.
Não sei porque sujeitam os introvertidos a tratamentos.
Só por não poderem ser chatos como os outros?
Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese.
Outro elemento da poesia é a busca da forma (não da fôrma), a dosagem das palavras.
Talvez concorra para esse meu cuidado o fato de ter sido prático de farmácia durante cinco anos. Note-se que é o mesmo caso de Carlos Drummond de Andrade,
de Alberto de Oliveira, de Érico Veríssimo
- que bem sabem (ou souberam) o que é a luta amorosa com as palavras.

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