domingo, 27 de setembro de 2009

Me fazendo um dengo



Liguei o rádio
Além dos pensamentos, queria outros ruídos no cérebro
Mais profanos, menos confusos

Caio F. Abreu

Muito ?


Você não cresceria se eu a mantivesse presa num pequeno vaso

Eu compreendi a tempo que você precisava de muito espaço

Caio F. Abreu

O melhor jeito de ver


Vimos uma margarida e nem sequer era Primavera

E disseste que margarida é amarelo e branco

E eu disse que branco era paz

E disseste que amarelo era desespero

E dissemos quase juntos

Que margarida era então

Desespero cercado de paz por todos os lados



Caio Fernando Abreu

sábado, 26 de setembro de 2009

Na Primavera


É agora que quero dividir maçãs

Achar o fim do arco-íris

Pisar sobre estrelas e acordar serena



Caio F. Abreu

Emprestado


De todos as cores, vermelho (não para vestir)

De todas as flores, rosa (na verdade todas)

Reza toda noite antes de dormir

E nunca esquece de agradecer pelas bonitezas do dia

Agradece também pelo que é feio, mas engrandece

Acredita que o sofrimento enobrece, mas nem sempre

Porque prefere o caminho mais fácil

Põe o pé direito pra fora da cama primeiro ( às vezes esquece)

Herdou algumas supertições, além do riso fácil e do olhar ágil

Está sempre apressada e atrasada

Fala mais com as mãos, que com a boca

Pensa mais rápido que fala e quase não fala o que pensa

Aprendeu a ser comedida

Tropeçou muitas vezes no caminho

Já se apaixonou pra sempre ( e para sempre vai ser sempre)

Já morreu de amor

Não acredita mais em príncipe encantado (na verdade nunca acreditou)

Mas torce pra que lhe provem o contrário todo-santo-dia




Briza Mulatinho

Como tudo na vida


E a vida existe e também é bonita

E se renova

Tem lados de luz



Caio F. Abreu

Novo, compreende?


E tudo, tudo voltava a ser antigo

E no entanto novo, compreende?



Caio F. Abreu

Silêncio dos Amantes


E se eu tivesse perguntado?

E se ele tivesse me dito?

Se eu tivesse merecido saber?

Isso me atormentou por longo tempo

Eu me sentia muito culpada

Hoje, acredito que não saber é o que torna a vida possível



Lya Luft

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Se descubra colorida


Enfeite-se com margaridas e ternuras

E escove a alma com flores com leves fricções de esperança

De alma escovada e coração acelerado

Saia do quintal de si mesmo

E descubra o próprio jardim



Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Início da Primavera


Primavera significa início do verão. O primeiro verão

É onde tiramos as roupas pesadas, as cores ficam mais coloridas

Na estação tudo fica mais leve, assim também na vida me disponho

A tirar tudo o que for pesado e sem cor, me colorindo e deixando o quente na pele

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Vou...


...o que de mais alto existe

minha alma alcança...



Fábio de Melo

Ainda existe gente que sonha


Na parede de um botequim de Madri, um cartaz avisa:

Proibido cantar

Na parede do aeroporto do Rio de Janeiro, um aviso informa:

É proibido brincar com os carrinhos porta-bagagem

Ou seja: Ainda existe gente que canta, ainda existe gente que brinca



Eduardo Galeano

sábado, 19 de setembro de 2009

Beijo


A língua girava no céu da boca

Girava

Eram duas bocas, no céu único



Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Verdades

Não sinto nada mais ou menos, ou eu gosto ou não gosto
Não sei sentir em doses homeopáticas. Preciso e gosto de intensidade
Mesmo que ela seja ilusória e se não for assim, prefiro que não seja
Não me apetece viver histórias medíocres
Paixões não correspondidas e pessoas água com açúcar
Não sei brincar e ser café com leite
Só quero na minha vida gente que transpire adrenalina de alguma forma
Que tenha coragem suficiente pra me dizer o que sente antes, durante e depois
Ou que invente boas estórias caso não possa vivê-las
Porque eu acho sempre muitas coisas
Porque tenho uma mente fértil e delirante e porque posso achar errado
E ter que me desculpar
E o faço sem dificuldade se me provarem
Que eu estraguei tudo achando o que não devia
Quero grandes histórias e estórias
Quero o amor e o ódio; quero o mais, o demais ou o nada
Não me importa o que é de verdade ou o que é mentira
Mas tem que me convencer, extrair o máximo do meu prazer
E me fazer crêr que é para sempre
Quando eu digo convicta que "nada é para sempre"
=
Gabriel García Márquez

Então, bem assim!


Ô minha filha
As suas dores não são as maiores do mundo e nem vão ser
Sacode a poeira. Toma um banho de rio
Abre essas asas. Grita alto, chora baixo
Pula alto e cai de cara. Desenha toda a beleza do mundo
Compra uma caixa de lápis de cor e sai aí colorindo a vida

Tati Bernardi

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Com rodeio mas sem embaraço


Posso dizer assim sem embaraço

Que este rodeio todo que ora faço

É simplesmente pra dizer: Tô te gostando!



Cecília Meireles

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Não tem jeito


Eu até já tentei ser diferente

Por medo de doer, mas não tem jeito:

Só consigo ser igual a mim




Ana Jácomo

sábado, 12 de setembro de 2009

E vou dizendo



E vou dizendo lento

Como quem tem medo de quebrar a rija perfeição das coisas

E vou dizendo leve

E vou dizendo longo sem pausa:



Gosto muito de você de você, muito... de você...



Caio Fernando Abreu

Desejo para o final de semana

Paz, amor e muito bico...

"Né não"

As mulheres não querem saber o que pensas.
Querem ouvir o que elas pensam numa voz mais grave
Bill Cosby

Kiss


Sim: a grande tragédia é este beijo incandescente

Nesses lábios congelados


Teixeira de Pascoaes

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Delicadeza


É com requintes de delicadeza que me conquistam

Mesmo que eu tenha crises de mau-humor ou de independências

Espera com tranqüilidade minha entrega, deixa eu querer ficar

Até que eu pense por dentro: “ isto é a felicidade!”

Mas não desarrume minha rotina tão bruscamente

Nem exija de mim o contrário do que havia quando me conheceu

Assim, eu serei outra pessoa, e nada mais restará do encanto

É com requintes de delicadeza que te guardarei no corpo

E não vou querer nada além do que nos parecer justo:

Tua mão na minha , meu olhar no teu

E um Universo inteiro por explorar...tão nosso

Ao contrário, eu me despeço

Com todo o requinte de delicadeza que certas crueldades têm



Marla de Queiroz

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Tudo ou Nada

Come on, Baby
Transformar esse limão em limonada
Passar da solidão pra doce amada
Pegar um trem pra próxima ilusão
Come on, Baby
Segurar esse rojão metade cada
Seguir o coração em disparada
Numa estrada que só tem a contramão

Come on, Baby
Arriscar num passe só de palhaçada
Faz de conta que o que conta conta nada
Apostar na falta de exatidão
Come on, Baby
Repartir toda noite em vários dias
Repetir tudo o que seja alegria
E sonhar na corda bamba da emoção

Come on, Baby
Voar sem avião, sem ter parada
Inverso da razão ou tudo ou nada
Fazer durar a chuva de verão

Come on, Baby
Você e eu, luar, beijos, madrugada
A vida não tá certa nem errada
Aguarda apenas nossa decisão
Itamar Assumpção - Alice Ruiz
Zélia Duncan

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Já que sou, o jeito é ser !

Inseta de jardim...!

Mas deveria


Onde já se viu o mar apaixonado por uma menina?
Quem já conseguiu dominar o amor?
Por que é que o mar não se apaixona por uma lagoa?
Porque a gente nunca sabe de quem vai gostar.





O Teatro Mágico - Ana e o Mar

domingo, 6 de setembro de 2009

Música para tudo


No filme Austrália os aborígenes criam música para tudo.
Para a pesca, para a morte, para a alegria p
ara os momentos tristes,
enfim, para tudo.

E criam música também para trazer para perto as pessoas
que amam e que estão longe.
Hoje, eu canto pra você...


..................

sábado, 5 de setembro de 2009

Hoje


Mais do que promessas

Quero secretas luzes que quebram a noite

Decifram espaços

Descobrem geografias

Misturam-se em límpidas águas

E cristais da alma



Quero forrar a alma

Com o tecido da doce poesia

Feita de instantes


Escreverás meu nome com todas as letras

Com todas as datas, e não serei eu

Repetirás o que me ouviste, o que leste de mim

E mostraras meu retrato, e nada disso serei eu

Dirás coisas imaginárias, invenções sutis

Engenhosas teorias, e continuarei ausente

Somos uma difícil unidade

De muitos instantes mínimos, isso serei eu



Cecília Meireles

Indo em frente


Nada tenho a ver com não gostar de mim

Me aceito impura, me gosto com pecados

E há muito me perdoei



Martha Medeiros

Vou além


Sou entre flor e nuvem

Por que havemos de ser unicamente humanos?



Cecília Meireles


Saudade

A memória é um Midas
Transforma em agora
Todo passado que toca



Anderson Santos

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Passo a passo

Mas primeiro prova da terra

Depois voa...



Caio Fernando Abreu

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Logo eu


Ah, tem-se que abrir o coração. Garotas românticas não têm outro destino.
Elas sabem que janelas fechadas dificultam a entrada de assaltantes e resfriado,
mas também impedem a passagem da lua para dentro do quarto.
Não há como viver com a alma sem cor pela porta trancada, onde luz alguma adentra para iluminar os cantos. Há todos esses espinhos no meu quarto e o desejo comedido de ter a luz acesa para me esquivar deles. Mas, se acendo a luz, perco os desenhos feitos pelo encontro da penumbra com o farol dos carros pela persiana.
Acho que não deviam ter-me lido poesia quando eu era pequena. Meu imaginário povoou-se de idéias de ternura e tempestades, idéias de que sem paixão, não é para ser, não é para sequer, se mover. Não sei agir diante da dureza e do caos.
Ninguém sabe. Eu, menos ainda. E agora, eu aqui, me decidindo se vou pelo caminho fácil, ou se continuo pelo meu caminho, onde tudo nunca é menos que em demasia. É que às vezes quase canso e queria saber seguir sem sentir tanto, tudo.
Mas não sei se posso, se consigo. Talvez não me seja permitida a brandura das coisas.
Amores ou dores, só em rompantes, jorros, espasmos.
Logo pra mim, que queria não sentir, que queria pra mim, toda a sobriedade advinda da covardia de não sentir nada. Logo para mim, que, quando criança, quase morri de pena do Bandeira, por saber que o porquinho-da-índia que ele tanto amava, não queria sair debaixo do fogão.
Luzzsh

Selvagem


Existe um ser que mora dentro de mim

Como se fosse casa dele, e é

Trata-se de um cavalo lustroso

Que apesar de inteiramente selvagem

Pois nunca morou antes em ninguém

Nem jamais lhe puseram rédeas

Nem selas

Apesar de inteiramente selvagem

Tem por isso mesmo uma doçura primeira

De quem não tem medo



Clarice Lispector

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Carta de amor para mim mesma. Porque só eu sei o que preciso ouvir

Kisstina

Escrevo enquanto te olho por dentro. O que vejo nem precisa ser bonito, nasci para amar tudo que vem de você. Escrevo pra te fazer um afago. Porque te conheço inteira, naquela hora em que tudo é silêncio e sombra, naquela hora em que sua gargalhada é um sol. Desse seu corpo que nasceu para abraçar, eu conheço cada poro, cada taqui-bradi-cardia. Conheço cada sopro, cada falha na tua voz. Toda a força do teu canto desafinado, eu conheço. A intensidade do teu gozo, a fluidez das tuas palavras orgásticas que não admitem tutelas. Eu te conheço além da tua relação com as pessoas que você ama. Com essas que você se recusa a odiar porque não quer despender energia pra isso. Eu te conheço doendo. Eu te conheço em paz. E sei quando você finge que nunca fingiu um orgasmo. E é por isso, Kiss, que eu sou a pessoa que mais poderia amar você. Porque não me interessa onde você erra, me interessa o que você aprende, apreende, absorve. Me interessa é como você se transforma. Interessa é o teu olhar de novidade derramado sobre as coisas simples e cotidianas como se descobrisse a essência do mundo diariamente. O que interessa é esse seu medo da morte, a sedução que ela exerce sobre você e o teu instinto de vida tão maior que tudo. Eu te conheço boêmia, anestesiada porque tua intensidade sufocando, apertando os dentes. Eu te conheço premonitória, plantando esperanças porque a intuição disse que sim, vai dar certo, e deu. Eu te conheço arrasada, opaca, ferida, feroz. Rabugenta.Confusa. E não é menos Kisstina. É a outra ponta do extremo. A totalidade. Eu te conheço tendo recaídas, não sendo ingênua mas optando por acreditar no outro de novo, de novo, de novo. Mas só até a terceira vez. Eu te conheço com um mau-humor contagiante, com uma disposição esfuziante, com uma alegria solitária, com todos os teus amigos na praia, ou sozinha com os teus livros e uma canga à parte pra eles. Aquela que só entra no mar de mãos dadas com alguém porque tem medo de não sair. A que evita altura porque quando olha pra baixo só pensa na queda. A que se treme inteira lendo seus textos em eventos poéticos porque tem fobia de público. A amiga popular e agregadora. A que morre de ciúmes e toma remédio efervescente pra acalmar a gastrite ciumenta.Eu nasci pra amar você porque sei dos teus desesperos, tropeços, anseios. Sei da tua honestidade quando sente. E dessa intranqüilidade pela falta de ambição.Te conheço acordando de madrugada só pra anotar uma frase. E fazendo da prosa poética teu sossego. Da vontade que você tem de voltar logo pra casa só pra escrever aquele texto que nasceu durante a caminhada. Das tuas roupas com cores desconexas. Da tua irritação com pessoas desconectadas. Tua preocupação com o lixo. Teu preconceito com o luxo. E a solidão permanente e o teu namoro com a escrita.
O que ainda posso dizer? Que você, Kiss, vive para a palavra, mas anseia viver exatamente aquilo que ela não alcança. E é por isso que eu te amo além do amor.
Eu te amo para sempre. Hoje.


Este texto é de Marla de Queiroz, dela para ela mesma

Onde se lê Kisstina, no texto original se lê Marla