domingo, 24 de junho de 2007

Oração à mim mesmo

Que eu me permita
Olhar e escutar e sonhar mais .
Falar menos .
Chorar menos

Ver nos olhos de quem me vê
a admiração que eles me têm
e não a inveja que prepotentemente penso que têm.

Escutar com meus ouvidos atentos
e minha boca estática,
as palavras que se fazem gestos
e os gestos que se fazem palavras .

Permitir sempre
escutar aquilo que eu não tenho
me permitido escutar.

Saber realizar
os sonhos que nascem em mim
e por mim
e comigo morrem por eu não os saber sonhos

Então , que eu possa viver
os sonhos possíveis
e os impossíveis ;
aqueles que morrem
e ressuscitam
a cada novo fruto,
a cada nova flor,
a cada novo calor,
a cada nova geada,
a cada novo dia.

Que eu possa sonhar o ar,
sonhar o mar,
sonhar o amar,
sonhar o amalgamar.

Que eu me permita o silêncio das formas,
dos movimentos,
do impossível,
da imensidão de toda a profundeza.


Que eu possa substituir as minhas palavras
pelo toque,
pelo sentir,
pelo compreender,
pelo segredo das coisas mais raras .


pela oração mental
(aquela que a alma cria e
que só ela, alma, ouve
e só ela, alma, responde).


Que eu saiba dimensionar o calor,
experimentar a forma,
vislumbrar as curvas,
desenhar as retas,
e aprender o sabor da exuberância
que se mostra
nas pequenas manifestações
da vida.


Que eu saiba reproduzir na alma a imagem
que entra pelos meus olhos
fazendo-me parte suprema da natureza,
criando-me
e recriando-me a cada instante.

Que eu possa chorar menos de tristeza
e mais de contentamento.

Que meu choro não seja em vão
que em vão não sejam
minhas dúvidas.

Que eu saiba perder meus caminhos
mas saiba recuperar meus destinos
com dignidade.

Que eu não tenha medo de nada,
principalmente de mim mesmo:
- Que eu não tenha medo de meus medos!


Que eu adormeça
toda vez que for derramar lágrimas inúteis,
e desperte com o coração cheio de esperança.



Que eu faça de mim um homem sereno
dentro de minha própria turbulência,


sábio dentro de meus limites
pequenos e inexatos,


humildade diante de minhas grandezas
tolas e ingênuas
(que eu me mostre o quanto são pequenas
minhas grandes
e o quanto évaliosa
minha pequenez).


Que eu me permita ser mãe,
ser pai,
e, se for preciso,
ser órfão.


Permita-me eu ensinar o pouco que sei
e aprender o muito que não sei,

traduzir o que os mestres ensinam
e compreender a alegria
com que os simples traduzem suas experiências;


respeitar incondicionalmente
o ser;
o ser por si só,
por mais nada que possa ter além de sua essência,


auxiliar a solidão de quem chegou,
rendeu-me ao motivo de quem partiu
e aceitou a saudade de quem ficou.

Que eu possa amar
e ser amado.
Que eu posso amar mesmo sem ser amado,

fazer gentilezas quando recebo carinho,
fazer carinho mesmo quando não recebo gentilezas.

Que
eu jamais fique só
mesmo quando
eu me queira só.


Amém.

Osvaldo Antônio Begiato